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O Verdadeiro Presente 4.5

Em Crônicas
abril 25, 2024

Marcelo do Ó, Jornalista e Narrador Esportivo.

 

Deus é um conceito. Uma ideia. Foi difícil entender isso quando, aos 25 anos, eu li a primeira pergunta de “O Livro dos Espíritos”. A questão e a resposta. O nosso inconsciente católico brasileiro nos coloca o Criador como um grande tutor barbado que nos pune e nos presenteia de acordo com as nossas atitudes. Encará-lo como “o que”, como “algo” é muito estranho para nós, Espíritas.
Foram anos de estudo, dezenas de livros lidos. Nenhum me trouxe a exatidão do “que é Deus”. Nem as desventuras e aventuras da vida me trouxeram isso. Por mais que eu tentasse plasmar uma concepção d’Ele, o velho cabeludo de cajado permanecia ali, me olhando com cara de bravo. Até que uma simples cena cotidiana, banal até para qualquer família, descortinou em meus olhos e minha alma.
Uma música de gosto duvidoso, numa festa de aniversário na garagem de uma casa humilde na periferia de São Paulo. Um casal dançava no centro de uma roda em que todos batiam palmas, espantados e felizes. Ele, de camisa cor de laranja, olhava para todos de queixo erguido, ostentando seu topete grisalho. Sorria, vermelho de vergonha. Em seu peito, uma senhora magrinha, com chapinha no cabelo, encostava a cabeça leve e rapidamente no peito dele, olhos fechados e um sorriso aberto, num misto de satisfação e timidez.
Gerson e Judite. Meu pai e minha mãe. Apartados por décadas de desventuras e escolhas, discussões, dissensões, separações e tudo aquilo que o Espiritismo chama de provas expiações em quase 50 anos de convivência mútua, eram eles ali exercitando por 5 minutos o perdão em sua forma pura. Minha irmã gritou no portão. “Marcelo, corre aqui para ver isso!”. Juntos, choramos, olhando o relógio do tempo nos mostrar o que é Deus: a moviola do Universo que converge todos nós ao amor, inevitavelmente.
Há 20 anos, talvez menos, certamente mais, esta cena seria impossível. Por tudo o que nós quatro, em família, vivemos naquele quintal de duas casas, hoje um sobrado, seria impensável. Mas os descaminhos que todos nós tomamos em décadas, nos levou àquele momento. Eram três décadas sem uma grande festa da família, como nos anos 80. Todos os primos e tios que viam naquele tempo tudo terminar em briga e lágrimas, assistiram atônitos, um instante de brilho e amor.
Naquela cena eu vi Deus. Uma força que encadeia vidas e une arbítrios livres como nos livros de André Luíz, nas crônicas psicografadas por Chico Xavier. Com um bônus: ainda todos estamos encarnados podendo rever nesta vida os débitos de hoje e de ontem. Duas horas depois, as correntezas da vida levaram as águas ao seu lugar antigo e as expressões felizes foram tomadas pela força do dia a dia, mas este instante está petrificado em nossos Espíritos.
Deus é isso. A Suprema Inteligência, que encaminha as demais, causa primária de todas as coisas que levam ao amor e ao infinito, soberanamente justo e bom porque o final do filme da vida, mesmo que seja um suspense ou um thriller, sempre será feliz. Se ele ainda não é, talvez não tenha terminado. Este foi o meu maior presente dos 45 anos desta minha encarnação.

 

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Jornalista, Narrador Esportivo, Palestrante e Instrutor Espírita.

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